A cidade corre de um lado para o outro. Há pessoas apressadas nos passeios. Os carros, as motas, as bicicletas, os autocarros e as trotinetas descem e sobem as ruas num alarido incessável. É de manhã, ainda não chegaram as nove. O céu tem poucas nuvens. Nada que se compare à neblina típica do meu oeste. Avanço lentamente entre funcionários apressados sem vontade no rosto, estudantes aperaltados com as suas capas e um olhar de esperança e turistas ora perdidos ora encantados.
Respiro fundo e absorvo a movimentação. Não me encaixo em nenhuma categoria destas pessoas. Quem sou eu? Sou uma alma de passagem, uma visita rápida que entra e sai sem ser notada. Paro. Sento-me num banco de jardim que não está num jardim, virada para as vias agitadas com apitadelas e fumo a sair de escapes de carros que parecem voar. Ouço os barulhos da cidade. Atento às pessoas que nada veem. Estou sozinha e estou bem. Sinto que tenho um manto de invisibilidade que me esconde do vaivém citadino. Até que o feitiço se quebra. Bom dia! Sabe onde é o banco?, Bom dia. Não sei, desculpe. Do que me estou a desculpar? Não faço ideia! É este síndrome de imperfeição que me arranca as palavras da boca sem eu dar por isso.
Levanto-me e volto a seguir caminho. Passo pelas montras de lojas caras com montras minimalistas e douradas e pelas entradas gigantes de hotéis prestigiados com porteiros de cartola. Vejo prédios com paredes antigas, paredes pintadas, paredes modernas, paredes tapadas. Vagueio pelos passeios com pessoas de braços estendidos à espera da boa vontade de alguém que os veja. Paro nas passadeiras com os sinais vermelhos, enquanto espero e vejo as pessoas passarem quando não deviam. Finjo costume durante todo o tempo, mas o pensamento está a imaginar acidentes e a repetir frases feitas como "é assim que elas acontecem". Elas o quê? As coisas, as tragédias, as notícias... não sei bem. Só que não é nada de bom. Sou uma fatalista, perdoem-me. É mais forte do que eu.
Continuo a andar absorta em pensamentos e sem conseguir pensar em nada de concreto. Até que volto a parar. Tenho de verificar onde estou. Aconteceu-me outra vez. Deixei-me levar pelos passos e pelas vozes da minha cabeça e segui caminho sem ver por onde ia. A rua onde tinha de virar já passou. Voltou atrás, viro à direito. Entro pela porta que me acolheu estes dias. O mundo volta a desligar.
É incrível como, mesmo em movimento, nos perdemos por completo nos nossos pensamentos e só vamos adiante.
ResponderEliminarBonita publicação. O meu aplauso e elogio. Cumprimentos poéticos
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