08/03/2020

CARTA

escrita criativa - mar de palavras - carta


Olá,

Queria escrever-te uma carta, mas é impossível fazê-lo sem os meus olhos começarem a chorar. Tenho saudades tuas. Era suposto tudo ser mais fácil à medida que o tempo avança. Mas não! A cada dia que passa a saudade é maior e o coração fica mais apertado. Vai-se criando fórmulas para lidar com a situação, mas haverá sempre um vazio crescente. Um vácuo de coisas por dizer e momentos por partilhar. Sinto falta das nossas conversas, das nossas brincadeiras, das tuas histórias, dos teus conselhos. É irónico como a pessoa mais surda que alguma vez conheci, fosse a melhor ouvinte que tive ou terei. A vida é mesmo assim. Irónica. E com um toque de masoquista, dando nos chapadas à toa, tirando-nos o tapete em momentos que pensamos ter os pés bem assentes na terra. Perder-te não foi fácil, mas foi mínimo se comparado com toda a tua vida.


Não pensemos mais nisso. Vamos pôr que passou para trás das costas. Falemos de coisas bonitas. Estamos em março e é quase primavera. As andorinhas devem estar quase a chegar e as papoilas a nascerem. Eu aviso-te quando vir as primeiras. Prometo! Sempre o fiz e sempre o vou fazer. Afinal, não é preciso escrever-te uma carta. Tu continuas presente. Seja nas conversas de todos, nas fotografias, ou, simplesmente, quando fecho os olhos e sussurro para ti. Ora numa tentativa de ganhar forças e encurtar as saudades, ora num desabafo sem resposta.

Tinha tanta coisa para te contar - como tem sido a minha vida, com os miúdos cresceram, o estado do mundo ou apenas como estava o mar - mas nem todas as folhas do mundo chegariam para substituir as nossas horas de tagarelice, sozinhas, naquela pequena sala fosse com o sol a entrar pela janela, ou com a chuva a cair pelos beirais do telhado. As duas contra o mundo e uma pela a outra. Só lamento não ter conseguido ter-te feito mais companhia.

Agora resta-me acreditar que estás bem. Melhor que nunca. Sentada à porta de onde quer tenhas ido, a lembrar as nossas conversas e a rir dos nosso disparates, enquanto esperas por mim. Tal como prometeste. No intervalo, cá vou seguindo com a minha vida e lutando pelos meus sonhos. Fazer-me feliz e deixar-te orgulhosa. 

Despeço-me por agora. Vou seguir as andorinhas. Tentar voar, tal como sempre quiseste que eu fizesse. Mas não te preocupes. Nunca mais ficas só. Levo-te sempre e para sempre comigo, até nos voltarmos a encontrar num sítio quentinho.

Até já.


Marisa

2 comentários

  1. Que carta tão terna, tão emocional! Fiquei mesmo comovida, porque é de um amor que nos transcende. Obrigada por esta partilha *-*

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Maira Gall